tag:blogger.com,1999:blog-37235592465615475752024-03-05T12:16:37.176+00:00Eternos Sentidos"tudo o que é ameaçado pelo tempo, para não morrer, segrega a mentira e, proporcionalmente, o perigo de morte. É por isso que não existe amor pela verdade sem uma admissão ilimitada da morte."Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.comBlogger148125tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-91746132638649547682009-11-02T22:38:00.003+00:002009-11-02T22:41:34.228+00:00Dia_Ri_A_Menteando na vida à procura<br />de uma noite menos escura<br />que traga luar do céu<br />de uma noite menos fria<br />em que não sinta agonia<br />de um dia a mais que morreu<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Camané</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-62409772597342085142009-10-22T10:43:00.001+01:002009-10-22T10:46:16.550+01:00Ana_Tu_Miateu corpo<br />dilui-se<br />nos ossos da página,<br />contamina<br />as cartilagens das sílabas<br /><div align="right"> </div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Al Berto</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-52061664026755736272009-10-20T00:44:00.000+01:002009-10-20T05:45:52.320+01:00DepoimentoDeponho<br />no processo do meu crime.<br />Sou testemunha<br />E réu<br />E vítima<br />E juiz<br />Juro<br /><br />Que havia um muro,<br />E na face do muro uma palavra a giz.<br />MERDA! – lembro-me bem.<br />– Crianças......<br />– disse alguém que ia a passar.<br />Mas voltei novamente a soletar<br />O vocábulo indecente,<br />E de repente<br />Como quem adivinha,<br />Numa tristeza já de penitente<br />Vi que a letra era minha...<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Miguel Torga</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-10830623834881236742009-10-12T00:43:00.001+01:002009-10-12T00:44:55.859+01:00(A)mar(her)esiasSe o mundo não tivesse palavras<br />a palavra do mar, com toda a sua paixão,<br />bastava. Não lhe falta<br />nada: nem o enigma nem<br />a obsessão. Entregue ao seu ofício<br />de grande hospitaleiro<br />o mar é um animal que se refaz<br />em cada momento.<br />O amor também. Um mar<br />de poucas palavras.<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Casimiro de Brito</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-76549434951360262942009-08-14T00:40:00.003+01:002009-08-14T00:43:52.178+01:00Mata-mequero morrer<br />com uma overdose de beleza<br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Al Berto</span></em><br /></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-16443743638395631422009-07-31T00:48:00.004+01:002009-08-14T00:44:56.094+01:00Quimera De Mim<div align="left">Como é possível perder-te<br />sem nunca te ter achado<br />nem na polpa dos meus dedos<br />se ter formado o afago<br />sem termos sido a cidade<br />nem termos rasgado pedras<br />sem descobrirmos a cor<br />nem o interior da erva.<br /><br />Como é possível perder-te<br />sem nunca te ter achado<br />minha raiva de ternura<br />meu ódio de conhecer-te<br />minha alegria profunda. </div><div align="left"> </div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Maria Teresa Horta</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-79890145523880188952009-07-29T22:09:00.003+01:002009-07-29T22:13:00.254+01:00Só (Contigo)Tentei fugir da mancha mais escura<br />que existe no teu corpo,<br />e desisti.<br /><br />Era pior que a morte o que antevi:<br />era a dor de ficar sem sepultura.<br /><br />Bebi entre os teus flancos<br />a loucura de não poder viver longe de ti:<br />és a sombra da casa onde nasci,<br />és a noite que à noite me procura.<br /><br />Só por dentro de ti há corredores<br />e em quartos interiores o cheiro a fruta<br />que veste de frescura a escuridão...<br /><br />Só por dentro de ti rebentam flores.<br /><br />Só por dentro de ti<br />a noite escuta o que me sai, sem voz,<br />do coração.<br /><div align="right"><br /><em><span style="font-size:85%;">David Mourão-Ferreira</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-54881823385960979032009-07-27T08:50:00.003+01:002009-07-27T09:14:48.526+01:00PreludioOs espelhos ainda nos devolvem a candura do que somos,<br />mas<br />também anunciam a cinza que sepultara os corpos,<br />algures,<br />num esquecimento e<br />numa dor obscura de nós próprios.<br /><br />Temos de aprender a subjugar o destino<br />à nossa vontade.<br />Ainda é possível mergulhar nos espelhos e<br />roubar-lhes os vestígios felizes de nossos rostos.<br /><br />Ainda é possível apagar as dolorosas manchas da memória e<br />recuperarmos o rosto da alegria que nos pertenceu.<br /><br />É esse o nosso rosto, mesmo que seja morto.<br /><br />Regressa.<br />Regressa ao escorrer dos dedos enrolados no sexo,<br />ao riso matinal dos corpos saciados,<br />às nocturnas conversas das esplanadas,<br />aos jogos de sedução,<br />aos engates,<br />ao murmúrio das vozes,<br />à ofegante trepidação da manhã,<br />regressa... regressa.<br /><br />Porque as palavras não te substituem e<br />estão cheias de pústulas no coração das sílabas.<br /><br />Regressa e<br />oferece-te à preguiça triste de quem continua aqui,<br />vivo,<br />sorvendo a espiral da sua própria ausência.<br /><br />Regressa, peço-te, mesmo antes de partires.<br /><br />Regressa à voracidade do desejo, e<br />à incendiada paixão dos nocturnos tigres.<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Al Berto</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-53277287014485765762009-07-26T16:28:00.002+01:002009-07-26T16:32:11.443+01:00De mim<div align="justify">Sei que darei ao meu corpo os prazeres que ele me exigir. <br />vou usá-lo, desgastá-lo até ao limite suportável, <br />para que a morte nada encontre em mim quando vier.<br /></div><div align="right"></div><div align="right"><span style="font-size:85%;"><em>Al Berto</em></span></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-82850717626533521032009-07-17T18:26:00.001+01:002009-07-17T23:37:26.087+01:00Ou Isto Ou AquiloOu se tem chuva e não se tem sol,<br />ou se tem sol e não se tem chuva!<br /><br />Ou se calça a luva e não se põe o anel,<br />ou se põe o anel e não se calça a luva!<br /><br />Quem sobe nos ares não fica no chão ,<br />Quem fica no chão não sobe nos ares.<br /><br />É uma grande pena que não se possa<br />estar ao mesmo tempo em dois lugares!<br /><br />Ou guardo dinheiro e não compro o doce,<br />ou compro o doce e não guardo o dinheiro.<br /><br />Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...<br />e vivo escolhendo o dia inteiro!<br /><br />Não sei se brinco, não sei se estudo,<br />se saio correndo ou fico tranqüilo.<br /><br />Mas não consegui entender ainda<br />qual é melhor: se é isto ou aquilo.<br /><br /><div align="right"><em><strong><span style="font-size:85%;">Cecília Meireles</span></strong></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-33435094424477536802009-07-11T21:38:00.009+01:002009-07-11T22:39:06.477+01:00Asfixia<div align="justify">Não se sabe como acontece, nem quando.<br />Digo o desejo, que tudo arrasta, que tudo envolve num aperto que asfixia. A vontade de anular todo o espaço entre as coisas no ardor dos corpos, no misturar das línguas.<br />O sexo é o caos, o precipício para onde nos lançamos entrelaçados.<br />O desejo atinge a cabeça no centro do sexo. O seios aprumam-se ao menor toque suave dos dedos. A cabeça do sexo erguida, Raquel fica estátua, medusa petrificada onde só os olhos muito azuis brilham. As bocas abocanham o sexo escorregadio, agarram-se ás reentrâncias, á pele por debaixo de tudo.<br /><br /><em>Nada mais quero do mundo senão a tua flor coberta de orvalho</em>, sussurra um de nós, sem que ninguém o oiça.<br /><br />Vera desata o cabelo. O cabelo escorre pelo tronco de Raquel, o sexo no meio do vermelho dos lábios.<br />Alguém de repente levanta-se, corre sedento a beber água, aos golos, como se a houvesse pela primeira vez, regressa e senta-se no sofá, intoxicado pelo fumo, preso às imagens interditas.<br />Não se ouve qualquer música, é um trabalho sério. Ouvem-se só, de quando em quando, pequenos gritos, palavras fracas, frases por terminar, sobre as respirações ofegantes. Um corpo a corpo de mulheres, meninas.<br /><br /><em>Eu fico sem saber de nada, de nadinha.<br />Quem comanda?</em><br /><br />A mão encontra o sexo que encontra a boca e tudo se desfaz para se refazer numa exaltação de abandono. Os corpos são coisas sem vontade, desamparadas. A boca encontra a boca, desfaz-se nela em beijos fundos. A boca encontra o seio, engole-o. O sexo avança pela carne, a mão de Vera indicando o caminho.<br />Não há palavras.<br />Quem diria. É preciso uma ordem mínima. Raquel segura Vera por detrás que se oferece como um fruto. Os movimentos repetem o prazer que só por si anseia, por vezes mais agudo, quase dor, que se escapa do interior para o exterior dos corpos. Os corpos vindo-se reviram-se para desvendar mais um segredo.<br /><br /><em>Nunca tive prazer assim tão fortemente</em> confessa uma voz comovida.<br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj6SUk_k-Hfg6rkrAsv7e6R_ER7HATDrwv8UCs5WdDELNHmt8yll7OQ6vy_CFGSM0oALSXdQco5sFzD3xN4dlSDPqWfqQPepkdjWW57BfPP4VzTjaT7rGULuK96SBxWmmt664MNko9LvHs/s1600-h/Hour_pt2_by_Exilia.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 400px; DISPLAY: block; HEIGHT: 400px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5357319705355929298" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj6SUk_k-Hfg6rkrAsv7e6R_ER7HATDrwv8UCs5WdDELNHmt8yll7OQ6vy_CFGSM0oALSXdQco5sFzD3xN4dlSDPqWfqQPepkdjWW57BfPP4VzTjaT7rGULuK96SBxWmmt664MNko9LvHs/s400/Hour_pt2_by_Exilia.jpg" /></a><br />Há lágrimas. As mulheres são infinitas.<br />O macho tem de dosear o sémen, a corrente, o líquido de que é feito.<br />A sofreguidão, no entanto, aumenta. Vale tudo o que der mais prazer ao outro, que o prazer vem do outro, num explendoroso reflexo.<br /><br /><em>A tua face desfeita, como é linda</em>. <em>Os teus cabelos são sedas onde me perco. O teu sexo pulsa por cima do meu coração aflito.<br /></em><br />O sexo é o caos primordial antes da separação dos corpos, que liga a morte à vida. As coisas são todas as coisas a que se possa lançar a mão, roubar o fruto, sorver a corrente de suor que se escapa do interior dos corpos virados do avesso. Só a exaustão tranquiliza, pode parar o movimento que por si não se esgota, são só suspiros agarrados uns a outros num sufoco, numa asfixia.<br /><br /><em>Quem sabe quem irá terminar o que ninguém começou?</em><br /><br />E, de repente, um pano de seda vermelho escuro cai esvoaçando sobre os corpos confundidos, tapando um braço, uma mão, uns cabelos negros, protegendo o sono dos audazes e o tempo, devagar aos soluços, volta a tomar conta de tudo.</div><div align="right"><br /><em><span style="font-size:85%;">Pedro Paixão</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-10172450593907601322009-07-10T18:05:00.002+01:002009-07-10T18:07:34.298+01:00Infinitamente MetafóricoNada é, tudo se outra.<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Fernando Pessoa</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-62718660999487094472009-07-04T00:48:00.004+01:002009-07-04T00:59:59.675+01:00Instintiva|mente<div align="justify">Estou nervoso, é a primeira vez que a revejo.<br />Sem que venha a propósito, conto segredos, faço confidências de que logo me arrependo.<br />A distância física é também uma distância, um afastamento interior. Falo de mim como quem fala de uma outra pessoa que julga conhecer bem, ou pelo menos, isso presume.<br />Não creio que G. tenha acreditado ou mesmo entendido o que lhe quis dizer. Por isso, a partir de certa altura, os segredos transformam-se em pequenas mentiras, em efabulações. Fizemos o que é mais habitual duas pessoas fazerem, preenchemos todo o tempo com palavras, enquanto os corpos de dois animais, frente a frente, se alimentavam.</div><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Pedro Paixão</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-53346537590111667072009-06-29T22:19:00.010+01:002009-06-29T22:47:20.242+01:00Vive o instante que passa.<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6n3YK176UDaHWupwUD32PyacMmtkN7-uPYSYCSXlgvy31YzBL2u9hQTgwXAaln3mTaqjGSqdvIPUtXf80g6vvGjuOD1aM03dncVoxHEDn2IQoetdxlsQi1BdFYo2f3-4m6ZcvYArUo8M/s1600-h/29e225d5b8ecb92c.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 148px; FLOAT: left; HEIGHT: 400px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5352867920435614690" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6n3YK176UDaHWupwUD32PyacMmtkN7-uPYSYCSXlgvy31YzBL2u9hQTgwXAaln3mTaqjGSqdvIPUtXf80g6vvGjuOD1aM03dncVoxHEDn2IQoetdxlsQi1BdFYo2f3-4m6ZcvYArUo8M/s400/29e225d5b8ecb92c.jpg" /></a><br />Vive-o intensamente até à última<br />gota de sangue. É um instante<br />banal, nada há nele que o distinga<br />de mil outros instantes vividos.<br />E no entanto ele é o único por ser<br />irrepetível e isso o distingue<br />de qualquer outro. Porque nunca<br />mais ele será o mesmo nem tu que o<br />estás vivendo. Absorve-o todo<br />em ti, impregna-te dele e que ele <br />não seja pois em vão no dar-se-te<br />todo a ti. Olha o sol difícil <br />entre as nuvens, respira à <br />profundidade de ti, ouve o vento.<br />Escuta as vozes longínquas de<br />crianças, o ruído de um motor que<br />passa na estrada, o silêncio que<br />isso envolve e que fica.<br /><br />E pensa-te a ti que disso te apercebes, sê vivo aí, pensa-te vivo aí, sente-te aí. E que nada se perca infinitesimalmente no mundo que vives e na pessoa que és.<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Vergílio Ferreira</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-82554840421331425582009-06-20T11:26:00.001+01:002009-06-20T11:28:18.509+01:00Profunda Maresiadançamos à roda dum mastro,<br />saia em papel de seda bordada com búzios...<br />uma quadra flutua pela noite de nossos cabelos<br />rodopias,<br />e os teus amores são relembrados pela noite adiante<br />espalham-se estrelas cadentes, papoulas breves,<br />junco molhado e o mar enche-se novamente de pássaros,<br />embarcações semelhantes a beijos que nos percorrem de alegria<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Al Berto</span> </em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-66015685137319914902009-06-19T00:56:00.000+01:002009-06-19T01:00:15.444+01:00Despeito<div align="center">Hoje a obsessão foi mais forte.<br />Escrever-te.<br />E um dia perguntei-te se tinhas guardado estas cartas.<br />Tu olhaste-me com o teu sorriso breve e repreensivo.<br /><br />Rasguei-as,<br />naturalmente, disseste,<br />e porque havia de guardá-las?<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Vergílio Ferreira</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-73753760290079223872009-06-12T20:40:00.001+01:002009-06-12T20:40:00.554+01:00Disseram-me<div align="justify">que não se pode quebrar o coração a alguém que já o tem partido.<br />E eu pensei<br />Pode.<br />Podemos sempre partir os bocadinhos do coração em bocadinhos ainda mais pequenos, amachucar ainda mais o que nos resta, como se nos tirassem o último sopro de vida.<br /></div><em><span style="font-size:85%;"></span></em><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Patrícia Reis</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-59649085797261797392009-06-11T16:40:00.000+01:002009-06-11T16:40:00.775+01:00Fila De EsperaEspera-se para tudo, somos feitos não de carne,<br />De paciência, se calhar já nascemos com um papelinho na mão.<br />Retire aqui o seu bilhete e aguarde a sua vez.<br />Aguardo a minha vez. Desde que me conheço que aguardo a minha vez.<br /><br /><div align="right"><span style="font-size:85%;"><em>António Lobo Antunes</em></span></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-46706263131846407492009-06-11T01:14:00.003+01:002009-06-11T01:17:18.882+01:00ilegível<div align="justify">O teu corpo, luz sobre a cama.<br />A escuridão chegará de um momento para o outro e tu perdes-te, minha amada, sobre os lençóis num sono que enche a noite. Enroscada como um animal perigoso que ao menor toque atacaria, a luz dos olhos fechada sob as pálpebras docemente descidas. Ainda se vê, no escuro, o seu fulgor. Não sei onde está aquela que eu persigo, por onde se passeia, erguida e nítida, quais os desejos de que se alimenta e os prazeres de que se constrói. Não sei que paisagens a acolhem, que língua humana fala. O teu corpo despido, estendido a meu lado, preste o ataque.<br />Tão frágil que me impede de lhe tocar.<br />Um imenso desejo.<br />A noite toma-te sem fazer perguntas.<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Pedro Paixão</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-9563225715508925512009-06-11T01:11:00.001+01:002009-06-11T01:17:48.826+01:00Sublinhado<div align="justify">Tenho um mau presságio.<br />Só escreve quem não está a bem com a vida, quem está desde sempre descentrado e busca o irremediável equilíbrio nas palavras.<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Pedro Paixão</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-34596695331424187232009-06-09T12:27:00.002+01:002009-06-09T12:29:59.110+01:00Mais Um (Dia)<div align="justify">Os dias longos, as noites no meio do mar.<br />Espero o porto de chegada, as virtudes restituídas, o espírito enfim reconciliado com o mundo.<br />E desembarco, há uma qualquer experiência surpreendente, caminho para o conhecimento.<br />Consigo agarrar essa meada ainda irreconhecível: a maneira como tudo se enreda em tudo.<br />Desabituei-me dos milagres.<br />Sabe-se como é: quase todas as manhãs acordo angustiado, esforço-me por imaginar que este dia é virgem e primeiro, carregado de poderes enigmáticos, destinado às revelações.<br />Trata-se de mais um dia em que me vou chatear, aturar os meus semelhantes, a filha-de-putice teológico-emocional de um Deus que, ainda por cima, não existe.<br />Posso especular sobre a revolução, evidentemente.<br />Que revolução?<br />A revolução, claro.<br />Pois é: a minha revolução não dá um passo.<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Herberto Helder</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-88251969531920795062009-06-08T18:44:00.004+01:002009-06-08T18:48:13.822+01:00Os Meus Quartos Em Metades De Outros<div align="justify">Esta será, talvez, a forma mais prática e mais simples de nos conseguirmos prolongar, fazendo com que a nossa imagem permaneça viva na cabeça dos outros.<br />Perdemos, nisto, uma parte de nós próprios; sabemos que nos falta qualquer coisa, e que essa qualquer coisa que não conseguimos definir, e que é sem dúvida um pedaço da nossa alma, foi retalhada do nosso ser por esse olhar que nos fixou, e levou consigo a imagem em que a nossa essência encontrara a sua mais completa expressão, deixando-nos um vazio que não conseguimos definir, porque para isso precisaríamos das palavras de quem nos roubou a nós próprios.<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Nuno Júdice</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-73133703746912681802009-06-08T10:30:00.004+01:002009-06-08T10:36:33.418+01:00Capítulos<div align="justify">Eu decido correr a uma provável desilusão: e uma manhã recebo na alma mais uma vergastada - prova real dessa desilusão.<br />Era o momento de recuar.<br />Mas eu não recuo.<br />Sei já, positivamente sei, que só há ruínas no termo do beco, e continuo a correr para ele até que os braços se me partem de encontro ao muro espesso do beco sem saída.<br />E você não imagina, meu querido Fernando, aonde me tem conduzido esta maneira de ser!...<br />Há na minha vida um bem lamentável episódio que só se explica assim.<br />Aqueles que o conhecem, no momento em que o vivi, chamaram-lhe loucura e disparate inexplicável.<br />Mas não era, não era.<br />É que eu, se começo a beber um copo de fel, hei-de forçosamente bebê-lo até ao fim.<br />Porque - coisa estranha! - sofro menos esgotando-o até à última gota, do que lançando-o apenas encetado.<br />Eu sou daqueles que vão até ao fim.<br />Esta impossibilidade de renúncia, eu acho-a bela artisticamente, hei-de mesmo tratá-la num dos meus contos, mas na vida é uma triste coisa.<br />Os actos da minha existência íntima, um deles quase trágico, são resultantes directos desse triste fardo.<br />E, coisas que parecem inexplicáveis, explicam-se assim.<br />Mas ninguém as compreende.<br />Ou tão raros...<br /><br /></div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Mário de Sá-Carneiro, in "Cartas a Fernando Pessoa </span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-55543311768941593282009-06-06T14:51:00.002+01:002009-06-06T14:54:12.839+01:00As Nossas Respostas<div align="left">Sonhei contigo embora nenhum sonho<br />possa ter habitantes, tu a quem chamo<br />amor, cada ano pudesse trazer<br />um pouco mais de convicção a<br />esta palavra. É verdade o sonho<br />poderá ter feito com que, nesta<br />rarefacção de ambos, a tua presença se<br />impusesse - como se cada gesto<br />do poema te restituísse um corpo<br />que sinto ao dizer o teu nome,<br />confundindo os teus<br />lábios com o rebordo desta chávena<br />de café já frio. Então, bebo-o<br />de um trago o mesmo se pode fazer<br />ao amor, quando entre mim e ti<br />se instalou todo este espaço -<br />terra, água, nuvens, rios e<br />o lago obscuro do tempo<br />que o inverno rouba à transparência<br />da fontes. É isto, porém, que<br />faz com que a solidão não seja mais<br />do que um lugar comum saber<br />que existes, aí, e estar contigo<br />mesmo que só o silêncio me<br />responda quando, uma vez mais<br />te chamo.</div><div align="left"> </div><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Nuno Júdice</span></em></div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3723559246561547575.post-23999089909026551772009-06-04T23:32:00.004+01:002009-06-04T23:41:26.419+01:00A minha tácticaé olhar-te<br />aprender como tu és<br />querer-te como tu és<br /><br /><strong><span style="font-size:130%;"><span style="color:#99ff99;">A minha táctica</span><br /></span></strong>é falar-te<br />e escutar-te<br />construir com palavras<br />uma ponte indestrutível<br /><br /><span style="color:#99ff99;"><span style="font-size:130%;"><strong>A minha táctica</strong><br /></span></span>é ficar na tua lembrança<br />não sei como nem sei<br />com que pretexto<br />porém ficar em ti<br /><br /><span style="font-size:130%;color:#99ff99;"><strong>A minha táctica</strong></span><br />é ser franco<br />e saber que tu és franca<br />e que não nos vendemos<br />simulados<br />para que entre os dois<br />não haja cortinas<br />nem abismos<br /><br /><strong><span style="font-size:130%;color:#99ff99;">A minha estratégia</span></strong><br />é em outras palavras<br />mais profunda e mais<br />simples<br /><br /><span style="font-size:130%;color:#99ff99;"><strong>A minha estratégia<br /></strong></span>é que um dia qualquer<br />não sei como nem sei<br />com que pretexto<br />por fim me necessites.<br /><br /><div align="right"><em><span style="font-size:85%;">Mario Benedetti</span></em> </div>Eternos Sentidoshttp://www.blogger.com/profile/09429406104479281312noreply@blogger.com0