sábado, 11 de julho de 2009

Asfixia

Não se sabe como acontece, nem quando.
Digo o desejo, que tudo arrasta, que tudo envolve num aperto que asfixia. A vontade de anular todo o espaço entre as coisas no ardor dos corpos, no misturar das línguas.
O sexo é o caos, o precipício para onde nos lançamos entrelaçados.
O desejo atinge a cabeça no centro do sexo. O seios aprumam-se ao menor toque suave dos dedos. A cabeça do sexo erguida, Raquel fica estátua, medusa petrificada onde só os olhos muito azuis brilham. As bocas abocanham o sexo escorregadio, agarram-se ás reentrâncias, á pele por debaixo de tudo.

Nada mais quero do mundo senão a tua flor coberta de orvalho, sussurra um de nós, sem que ninguém o oiça.

Vera desata o cabelo. O cabelo escorre pelo tronco de Raquel, o sexo no meio do vermelho dos lábios.
Alguém de repente levanta-se, corre sedento a beber água, aos golos, como se a houvesse pela primeira vez, regressa e senta-se no sofá, intoxicado pelo fumo, preso às imagens interditas.
Não se ouve qualquer música, é um trabalho sério. Ouvem-se só, de quando em quando, pequenos gritos, palavras fracas, frases por terminar, sobre as respirações ofegantes. Um corpo a corpo de mulheres, meninas.

Eu fico sem saber de nada, de nadinha.
Quem comanda?


A mão encontra o sexo que encontra a boca e tudo se desfaz para se refazer numa exaltação de abandono. Os corpos são coisas sem vontade, desamparadas. A boca encontra a boca, desfaz-se nela em beijos fundos. A boca encontra o seio, engole-o. O sexo avança pela carne, a mão de Vera indicando o caminho.
Não há palavras.
Quem diria. É preciso uma ordem mínima. Raquel segura Vera por detrás que se oferece como um fruto. Os movimentos repetem o prazer que só por si anseia, por vezes mais agudo, quase dor, que se escapa do interior para o exterior dos corpos. Os corpos vindo-se reviram-se para desvendar mais um segredo.

Nunca tive prazer assim tão fortemente confessa uma voz comovida.


Há lágrimas. As mulheres são infinitas.
O macho tem de dosear o sémen, a corrente, o líquido de que é feito.
A sofreguidão, no entanto, aumenta. Vale tudo o que der mais prazer ao outro, que o prazer vem do outro, num explendoroso reflexo.

A tua face desfeita, como é linda. Os teus cabelos são sedas onde me perco. O teu sexo pulsa por cima do meu coração aflito.

O sexo é o caos primordial antes da separação dos corpos, que liga a morte à vida. As coisas são todas as coisas a que se possa lançar a mão, roubar o fruto, sorver a corrente de suor que se escapa do interior dos corpos virados do avesso. Só a exaustão tranquiliza, pode parar o movimento que por si não se esgota, são só suspiros agarrados uns a outros num sufoco, numa asfixia.

Quem sabe quem irá terminar o que ninguém começou?

E, de repente, um pano de seda vermelho escuro cai esvoaçando sobre os corpos confundidos, tapando um braço, uma mão, uns cabelos negros, protegendo o sono dos audazes e o tempo, devagar aos soluços, volta a tomar conta de tudo.

Pedro Paixão

3 comentários:

Arabesco disse...

A intemporalidade do mundo parado quando o desejo se encontra.




bj.dos Beijos

Som do Silêncio disse...

Simplesmente divinal...

Beijo meu

AnaMar (pseudónimo) disse...

Apaixonada por este autor...